A crise de ansiedade coletiva na escola é um lembrete para implodir a "caixa" escolarizante
“São cobranças, responsabilidades. Alguns não conseguem suportar e entram em surto. É complicado”.
Essa foi a fala de uma mãe diante do episódio de ansiedade coletiva ocorrido em uma escola estadual no Recife semana passada.
26 alunos tiveram, simultaneamente, sintomas como falta de ar, tontura, desmaios, tremores e choro compulsivo.
É difícil atribuir uma única causa a um fenômeno complexo como esse. Nas matérias que li, vi gente dizendo que era por conta da volta às aulas presenciais, da carga horária extensa da escola integral e até mesmo por causa do uso excessivo de celular e redes sociais – este último não passa de um julgamento grosseiro, diga-se de passagem.
A fala dessa mãe, no entanto, me causou indignação. Menos pelo seu conteúdo e mais pelas condições sistêmicas que a autorizaram a dizer isso.
Será que falaríamos algo parecido com pessoas adultas? Será que, em vez de culpar as vítimas, não seria melhor investigar mais a fundo as raízes estruturais desse episódio?
Uma tempestade não eclode do nada. É preciso muita condensação antes. Já havia algo no “espaço-entre” desses jovens que contribuiu para a crise ocorrer. Já havia algo de errado no ar dessa escola, por mais que se tratasse de uma “Escola de Referência em Ensino Médio”.
Uma pista: logo antes da crise de ansiedade coletiva, os alunos estavam fazendo provas. Só não houve a aplicação de mais provas depois porque o “surto” aconteceu.
Outra pista: foi relatado que um aluno tinha levado uma arma para a escola semanas antes do ocorrido.
O que havia de errado no ar dessa escola é, no fundo, a mesma coisa que está errada em quase todas as escolas: o modelo escolarizado de educação.
Ninguém quer ser cobrado por "responsabilidades” não consentidas. Ao mesmo tempo, todos queremos nos sentir protegidos e valorizados – e mostrar uma arma para os colegas é uma tentativa trágica de alcançar isso.
(A violência nas escolas é inversamente proporcional à liberdade dos estudantes de criarem suas próprias paisagens educativas. Aprendi com o Yaacov Hecht)
É preciso implodir a “caixa” escolarizante para que, em seu lugar, possam florescer responsabilidades livremente assumidas em vez de “cobranças mal suportadas”.
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