Aquilo que contamos sobre nós nos modifica, assim como a luz transforma as cores dos objetos.
Escolher como contar a própria história, quais palavras usar, quais imagens ela evoca e como a editamos – porque sempre rola uma edição – é uma arte cheia de bonitezas e um trabalho contínuo de autodescoberta.
Hoje resolvi contar aqui um pouquinho do que (acredito que) faço, na esperança de que isso me mostre coisas que escondo até de mim mesmo.
E também para partilhar com você, pelo simples prazer da prosa.
Vamos lá?
Sou o Alex.
Passei a última década da minha vida interessado na questão do aprendizado.
Como as pessoas aprendem livremente? O que as leva a encarar a aventura que é se deslocar do ponto A (conhecido) para o ponto B (desconhecido), sem nenhuma garantia de sucesso? Quem são as companhias ao longo dessa jornada e como elas podem apoiar e potencializar o aprender? Onde se dá o aprendizado, e quando? Como é o preparo para que as sementes da descoberta germinem? Qual a importância de se compartilhar os frutos da aprendizagem? Como o aprender se relaciona com as grandes questões que a humanidade e o planeta vivenciam?
São muitas as perguntas. E as conexões com outras temáticas também são inúmeras: de onde vejo, não dá pra separar.
Fiz um doutorado informal sobre o tema da aprendizagem que durou três anos – esse foi o meu ponto de não retorno na minha relação com esse solo.
Um doutorado informal é uma abordagem de pesquisa profunda e libertária criada pelo André Gravatá e depois sistematizada por mim, com o apoio do próprio André e de outras centenas de pessoas que colaboraram na sua construção.
Pense num doutorado acadêmico, mas sem as chatices e restrições da academia: é mais ou menos isso.
(A história em detalhes é contada no meu livro Doutorado Informal, que você pode baixar gratuitamente clicando aqui. Se quiser, leia ainda o Manifesto do Doutorado Informal pelo mesmo link acima)
Desde então, criei projetos para materializar a visão de aprendizagem que havia elaborado na minha pesquisa.
Sobretudo, iniciei comunidades de aprendizagem. Várias delas.
Comecei também a levar esse trabalho – e essa visão – para o mundo das empresas.
E foi aí que entendi que o discurso do lifelong learning, essa necessidade de as pessoas se manterem aprendendo o tempo todo, não encontrava lastro na vida real.
Todo mundo falando disso, é óbvio que é importante, mas como sair de:
uma narrativa tecnicista? (o aprendizado como um regurgitar técnico, instrumental, superficial – “aprenda a fazer sempre melhor, mas não questione o que é esse ‘melhor’”)
um discurso apocalíptico? (“se você não seguir aprendendo as novas tendências, se tornará obsoleto e perderá seu emprego para as máquinas”)
um descolamento trabalho X vida, o primeiro sempre vindo primeiro? (“aprenda a aprender para aumentar sua produtividade e inovação, o resto vem depois”)
uma ingenuidade quanto às influências da educação escolarizada, que via de regra só serve para nos encaixotar ainda mais? (“mais escolarização é sempre igual a uma maior capacidade, inteligência, conhecimento…” e outras crenças do mesmo balaio)
uma teoria bonitinha, mas sem caminhos práticos efetivos?
um amontoado de cursos e treinamentos, sem um olhar para a autodireção?
Esses são apenas alguns dos questionamentos, há muitos outros.
Se você realmente for estudar, vai ver que o “o buraco é mais embaixo”. Sempre é.
É por isso que, ao longo dos anos, eu fui me percebendo como uma voz alternativa no movimento educacional e no universo do “desenvolvimento de pessoas”.
Uma voz transdisciplinar, rebelde, artística, comunitária, politizada.
Da forma como vejo, o filosofar não se descola da prática.
As epistemologias não se descolam das metodologias.
O olhar poético não se descola da vida mundana.
O sagrado não se descola do profano.
O indivíduo não se descola das relações.
O Um não se descola do Todo.
O sujeito que observa não se descola do que observa e de como observa.
As camadas de contexto não se descolam do texto.
E por aí vai.
Eu passei muitos anos investigando o aprender, e é claro que isso me transportou a outros interesses, como sempre ocorre em qualquer percurso de aprendizado.
Hoje, sou uma pessoa que se interessa pela Vida e suas manifestações.
Gosto de narrar e do poder sensorial das palavras organizadas de determinadas formas – por isso escrevo.
Gosto de mostrar pra mais gente o poder do aprender e da autonomia que se pode conquistar nesse processo – por isso faço palestras, mentorias e consultorias.
Gosto de prosear e me conectar com outras vidas humanas – por isso gosto de encontros e de viajar.
E tantas outras coisas que não cabem nestas linhas, mas que, se um dia a gente se encontrar, eu juro que te conto (se você perguntar).
Me encanta ser uma alma pesquisadora do milagre que é viver. Um eterno aprendiz dessa condição.
Aliás, se tem uma palavra que carrego comigo é encantamento.
Descobrir coisas é um ato de encantamento; um maravilhar-se.
Isso pode ser emoldurado de muitas maneiras. Pode ser algo cooptado pelo sistema (como tudo) ou pode ser um ato de re-existência.
Passei o último ano me questionando se a aprendizagem ainda valia a pena como meu tema de vida, tamanha a minha desconfiança de que ela servia apenas como mais uma engrenagem da Máquina De Moer Gente dentro da qual vivemos.
Foi então que eu percebi que as contradições estão em todos os lugares e não vão desaparecer da noite pro dia.
Enquanto isso, precisamos seguir questionando, precisamos seguir descobrindo, precisamos seguir nos encantando, precisamos seguir.
Isso basta.
Além de todo esse caldo reflexivo, também estou outras coisas.
Toco gaita, faço carinho em gatos (depois de me tratar da alergia que tinha deles, glória!), gosto de cantar, tenho tatuagens muito loucas e o meu quarto é todo de madeira.
Meu trabalho é plantar sementes.
Você que tá aqui, me ajuda a regar?
Como essa versão da minha história chega pra você?
E como você vem contando a sua?
Me diga nos comentários!
Re-existência é muito bom! Como uma só palavra já nos faz pensar, ou re-pensar!
Bora regar!
Adorei sua abordagem parabéns !! Ao ler percebe-se a maturidade e o equilíbrio e vc não mencionou isso. Acredito que a saúde mental permeia todas as experiências desde “como você entra ou encara” a situação, como passa por ela e seu resultado.
Se quiser trocar uma ideia sobre isso e conhecer a nossa start up focada no acompanhamento das emoções para uma jornada de cuidado ou auto conhecimento , será um prazer !!
Pode ser mais uma semente …
Abs
Alberto Tafla
Ego2Save