Contemplar, Compreender e Criar: ou como zerar o jogo do aprendizado autodirigido
Quando a musculatura cognitiva vira oásis de encantamento
Em sua interação com a realidade, seres humanos são impelidos pelo seus instintos a fazerem 3 coisas:
🌅 Contemplar
🤯 Compreender
🎨 Criar
Ainda que tudo isso seja de fato instintivo – até mesmo o “contemplar”, pois já se provou que macacos também param para admirar a paisagem em suas andanças –, essas musculaturas da cognição ficam muito mais robustas se botarmos intencionalidade nelas.
🌅 Contemplar
Quando eu contemplo (ou aprecio/admiro) algo, não estou preocupado primariamente nem em compreender nem em intervir.
Tudo que quero é apenas continuar sentindo e respeitando o misterioso frescor do fenômeno que me fascina – me deslumbrando, deixando-me afetar ora gentilmente, ora intensamente, ora alegremente, ora tristemente.
Você já sentiu isso alguma vez? É sobre sentir o contemplar.
Alguns objetos são criados pela humanidade para serem contemplados. É o caso de muitos itens do armário que chamamos de arte, por exemplo.
Ainda assim, tudo aquilo que existe – o cosmos, os átomos e as ideias – é passível de ser contemplado.
🤯 Compreender
Quando eu busco compreender (no sentindo de investigar, entender) a realidade, meu desejo é desvendar os fenômenos.
Como funcionam? De que são feitos? De onde vieram e para onde vão? Por que importam?
A ação primordial do compreender é a construção de perguntas, hipóteses e teorias. E a premissa básica é a de que sempre há mais saberes escondidos por trás de cada coisa.
(Na verdade, não é que há saberes “escondidos” no sentido de que nós os achamos. Nós produzimos os saberes através das formas de olhar – as perguntas, hipóteses e teorias – que escolhemos. Mais sobre isso no final do texto)
Compreender, dos três, é o verbo que o senso comum mais aproxima da ideia de aprendizado. E é compreensível (perdoe-me o trocadilho), considerando o cenário altamente racionalizante e a prevalência da “lógica da explicação” na educação.
Na real, aprender é muito mais do que compreender.
🎨 Criar
Quando eu crio a (ou intervenho na) realidade, eu coloco a minha marca no mundo, seja pela via material (objetos, coisas físicas) ou imaterial (ideias, visões).
Criar envolve o fazer, mas vai além – é autoralidade, legado, singularidade.
É uma contribuição que você faz e que enriquece a realidade, e que mesmo se ninguém te pedisse para fazê-la, você possivelmente faria mesmo assim, pois nossos corpos são criadores.
O ego, inclusive, serve para isso.
Olhando a partir de uma camada mais profunda, tanto o contemplar quanto o compreender são também atos de criação. Nós não “estamos” no mundo, nós “criamos” o (nosso) mundo através das infinitas relações que tecemos com o meio.
(Já escrevi sobre essa brisa de diferentes formas aqui, aqui e aqui)
🌠 A aprendizagem que eu acredito é feita dessas três musculaturas cognitivas: contemplação, compreensão e criação.
Tente perceber como é pra você contemplar, compreender e criar.
Não precisa fazer nada além do que você já faz.
Assistindo a um filme, conversando com alguém, tentando resolver um problema, olhando para o céu estrelado, tomando uma água de coco, escrevendo um texto, viajando...
Como as suas células pulam? O que acontece com a unha do seu dedão do pé?
Obs. 1: este texto é uma versão revisitada e expandida de um post que publiquei no final de 2022.
Obs. 2: o estudo sobre os macacos que contemplam está no livro Why We Believe, do Agustín Fuentes, ainda sem tradução para o português. Cheguei a indicar a leitura desse livro em um post.