Eu assumo: tenho compulsão por Whatsapp.
Eu estava teimando um pouco em admitir, sabe? Igual aquelas pessoas – a gente sempre conhece uma – que insistem em dizer que não são alcoólatras, mas não conseguem ficar um dia sem beber.
Minha ansiedade com o Whatsapp está umbilicalmente vinculada à minha ansiedade social. E isso – vou te poupar de grandes autoanálises para irmos direto ao ponto – se resume em: meu medo de não ser amado.
É claro que a questão não é puramente individual (nunca é, e se quiser saber mais sobre o que penso sobre o cenário opressor das novas tecnologias, indico a leitura deste outro artigo meu). Pertenço à última geração que não é nativa digital, o que significa dizer que, quando criança, eu ainda estava protegido da ubiquidade das tecnologias digitais e, especificamente, da onipresença dos aplicativos de mensageria instantânea.
Eu cresci com internet discada, e nisso eu adorava ficar papeando com amigues e paixonites em lugares como ICQ, MSN e outros. Passava várias horas fazendo isso, e sim, eu poderia estar fazendo coisas bem mais engrandecedoras – já era um vício, implantado pelos avanços absolutistas da tecnologia.
Só que, ainda assim, eu escolhia os momentos de “entrar” e “sair” daquele simulacro textual de afetos, e havia restrições claras: basicamente eu só entrava nos finais de semana e de madrugada, quando a internet era de graça.
Pensando com o chapéu da economia comportamental, poderíamos chamar esse cenário de décadas atrás de “opt-in”. A regra, nesse caso, é: você precisa fazer algo para ativar a coisa (no caso, a internet e, a partir dela, a troca de mensagens). O padrão é que “a coisa” esteja desativada.
Hoje em dia é bem diferente, você e eu sabemos – e, sinceramente, para pior. (Adivinha quem está lucrando com isso?)
Estar conectade digitalmente com nossos contatos pessoais e profissionais tornou-se um contínuo. Muita gente trabalha com o Whatsapp Web aberto o tempo todo, ou então checando a todo momento o celular. E, se não é o Whatsapp, são outros aplicativos de mensagem os ladrões do nosso tempo e da nossa paz de espírito.
A regra agora é “opt-out”, isto é, você precisa fazer algo para poder sair da coisa (por exemplo, usar o “modo avião”). O padrão é que “a coisa” esteja ativada o tempo inteiro, te acompanhando como uma sombra sedutora por onde quer que você vá.
Pode parecer bobagem, mas modificações naquilo que consideramos o “padrão”, seja tecnológica, social ou culturalmente, têm implicações profundas em nossos comportamentos. Isso, inclusive, é algo bastante estudado dentro da nova ciência comportamental no sentido de favorecer mudanças de hábitos – uma simples mudança no padrão de doação de órgãos de um país, por exemplo, pode significar um drástico aumento na quantidade de pessoas que optam por serem doadoras de órgãos.
Ao constatar o quanto minha ansiedade de Whatsapp me atrapalha de viver de verdade, eu tomei uma decisão: voltar para os tempos de “opt-in” de mensagens.
Para viabilizar isso, instalei um bloqueador de sites no navegador e um bloqueador de aplicativos no celular (BlockSite, tem versões tanto para o navegador quanto para o celular, e na versão gratuita já funciona bem). Em ambos, programei para que o Whatsapp permaneça bloqueado indefinidamente, até que eu faça alguma coisa para ativá-lo.
Estou testando isso há alguns dias e, vou te falar, o ganho de qualidade de vida é instantâneo.
Sinto falta? Sim.
De vez em quando tenho crises de abstinência? Com certeza.
A solução que encontrei é ideal? Não.
Ao mesmo tempo, sinto minhas emoções mais equilibradas, e meus dias rendem mais.
O melhor de tudo é não me sentir mais o tempo todo refém das mensagens que as pessoas me mandam. Estou abrindo o Whatsapp 2x ao longo do dia (1x de manhã e 1x à tarde) para resolver o que preciso resolver e dar alguns ois, e só à noite libero.
Mais do que isso eu já me sinto tendo uma recaída.
Como é a sua relação com o Whatsapp? Saudável e equilibrada? Tranquila? Terrível? Tóxica? Amor e ódio?
Bora conversar sobre isso? Deixa um comentário!
Aqui vão 2 indicações bem boas para ajudar a pensar esse tema:
Um vídeo do Emanuel Aragão (um filósofo e psicanalista com um canal no Youtube MUITO bom) – “O Whatsapp e o Fim do Amor”:
O texto “A Aceleração dos Vícios”, do Paul Graham, que traduzi e publiquei semana passada.
Muito bom, Alex! Também já me peguei buscando uma forma de "deslogar" do WhatsApp quando percebi que contribuía com a ansiedade que sinto no dia a dia.
Me perguntei: Como uma rede social com tanta informação não tem botão de sair? (Até o Instagram e o Facebook tem).
Se eu fosse a concorrência, criaria essa opção no app. O slogan seria: "Converse o quanto quiser, mas só quando você quiser."
Sinto que o fato de não haver a opção de deslogar um app de comunicação, tem muito a ver com a invisibilidade da necessidade de introversão (ao menos no ocidente). Tanto a invisibilidade das pessoas introvertidas, quanto de momentos de introversão mesmo para pessoas extrovertidas. É como se a necessidade de recolhimento (de afastamento social periódico) não existisse, mesmo ela existindo em todos nós, em maior ou menor grau.
A compulsão por interagir é automática quando só temos reforços mentais para interagir. E a famosa "bateria social fraca" mostra o quanto somos condicionados a interagir o tempo inteiro (é um sintoma da falta do botão de deslogar). Quando sentimos ansiedade na interação (mesmo não tendo dificuldade na comunicação) é provável que estamos nos sentindo forçados a interagir, quando a necessidade do momento é de recolhimento.
Interagir é muito bom, mas sem pausa pode causar exaustão mental, além da ansiedade.
Somos seres sociais, mas tbm somos seres individuais.
Agradeço pela indicação de app, vou testar por aqui tbm.